Ainda Estou Aqui - Crítica
24 de janeiro de 2025
Ainda Estou Aqui, dirigido por Walter Salles, é uma adaptação cinematográfica do livro de Marcelo Rubens Paiva, que narra a trajetória de sua mãe, Eunice Paiva, durante os anos da ditadura militar no Brasil. Ambientado em 1970, o filme nos apresenta à vida de Eunice (interpretada magistralmente por Fernanda Torres), uma mulher cuja vida muda completamente após o desaparecimento de seu marido, Rubens Paiva, capturado pelo regime militar. Com a ausência de respostas e a brutalidade da repressão, Eunice se vê forçada a abandonar sua rotina de dona de casa para se tornar uma ativista dos direitos humanos, lutando pela verdade sobre o paradeiro de seu marido e enfrentando as consequências de um regime opressor.
O filme não se limita a retratar um evento histórico, mas busca explorar as cicatrizes deixadas pela ditadura, mostrando como o sofrimento e a dor se disseminaram nas famílias brasileiras, em um contexto onde, muitas vezes, a violência não se manifestava de forma explícita, mas nas sombras, sem rostos visíveis. Walter Salles, conhecido por seu olhar sensível e humanista, vai além da história de Eunice, apresentando uma reflexão sobre o luto, a memória e a resistência. Ele aborda, de maneira única, o impacto do esquecimento e a luta pela justiça, revelando os danos invisíveis causados nesse período e a importância da preservação da memória, que se torna a base da luta pelo futuro.
A atuação de Fernanda Torres é o grande destaque do filme. Sua interpretação de Eunice é contida, mas profundamente comovente. A dor de sua personagem não se expressa em grandes explosões de emoção, mas nos pequenos gestos e olhares silenciosos que transmitem a força interior de uma mulher determinada a buscar respostas, mesmo quando essas respostas parecem inalcançáveis. Eunice se recusa a esquecer, a ceder ao silenciamento imposto pelo regime, e sua resistência silenciosa se torna o fio condutor da narrativa.

Walter Salles opta por uma abordagem mais sutil, evitando exageros dramáticos e focando na realidade da vida sob um regime autoritário. O filme capta as pequenas interações cotidianas, nas quais a presença constante do medo e da opressão permeia a vida das pessoas. Quando Eunice é presa e interrogada, o filme se aprofunda nas dificuldades que ela enfrenta, não só como vítima da ditadura, mas também como mulher tentando manter sua família unida em meio ao caos.
O Brasil dos anos 1970 é retratado com sensibilidade, mas mostrando claramente o impacto da repressão nas famílias e no cotidiano. Salles contrasta momentos de felicidade familiar com a ameaça constante da perseguição, criando uma tensão emocional que permeia a narrativa. Mesmo diante dessa opressão, o filme encontra momentos de humanidade, especialmente na figura de Eunice, que se recusa a deixar que a memória de seu marido e de todos os desaparecidos seja apagada.
Ainda Estou Aqui é um lembrete de que, mesmo em meio aos horrores da história, a luta pela verdade e pela justiça nunca deve ser abandonada. Salles, com sua sensibilidade única, nos entrega uma obra que transcende a história de uma mulher e se torna uma reflexão universal sobre o poder da memória, da resistência e da busca pela verdade.
Avaliação: 5 / 5 ⭐